30 de junho de 2009

Cadê você, Ulisses?

"Com Ulisses havia dado os primeiros passos para alguma coisa que até então desconhecia. Mas poderia agora avançar sozinha? Numa das últimas vezes ela lhe perguntara com um sorriso encabulado, procurando disfarçar com um tom levemente irônico: estou sendo autodidata? Ele respondera:
― Acho que sim. Muitas coisas você só tem se for autodidata, se tiver coragem de ser. Em outras, terá que saber e sentir a dois. Mas eu espero. Espero que você tenha a coragem de ser autodidata apesar dos perigos, e espero também que você queira ser dois em um. Sua boca, como eu já lhe disse, é de paixão. É através da boca que você passará a comer o mundo, e então a escuridão de teus olhos não vai se aclarar mais vai iridecer.

Ele não lhe telefonava, ela não o via: ocorreu-lhe então que ele tivesse desaparecido para que ela aprendesse sozinha.
...........
De repente Lóri não suportou mais e telefonou para Ulisses:
― Que é que eu faço, é de noite e eu estou viva. Estar viva está me matando aos poucos, e eu estou toda alerta no escuro.
Houve uma pausa, ela chegou a pensar que Ulisses não ouvira. Então ele disse com voz calma e apaziguante:
― Agüente.
"

Uma aprendizagem ou o livro dos prazeres
C.L.

Um comentário:

Márcia disse...

Adoro este fragmento...Iridecer é uma palavra linda, típica de Clarice.